O dia 8 de dezembro de 1980 é talvez o dia mais triste do Rock e da música, pois há 30 anos John Lennon era covardimente assassinado por um completo imbecil que não merece nem ter o nome lembrado.
Lennon era um verdadeiro gênio musical, poeta, porta-voz de uma geração inteira que sonhou com um mundo sem divisões, religiões e guerras.Já explicitei minha admiração por John por várias vezes nesse blog, veja algumas:
" "70 ANOS DE JOHN LENNON"
" "29 ANOS SEM JOHN LENNON"
Todos os seus álbuns de estúdio pós-Beatles foram relançados em edições remasterizadas, e fui presenteado com o CD "John Lennon / Plastic Ono Band", o primeiro disco de John Lennon após a separação oficial dos Beatles, e lançado em dezembro de 1970. Era o que faltava para completar a minha coleção.
John, principalmente a partir de 1968, vinha se sentindo tolido artisticamente e achando que precisava de mais espaço para se expressar, sem a pressão enorme de ser um beatle. Por isso paralelamente a banda, lançou 3 discos solos experimentais ao lado de Yoko (Two Virgins" em 1968, "Life With The Lions" e "Wedding Album" ambos de 1969), e um ao vivo ("Live Peace Toronto - 1969) gravado no Festival de Toronto com Eric Clapton na guitarra, o amigo dos tempos de Hamburgo, Klauss Voormann no baixo, e Alan White na bateria (que depois substituiria Bill Bruford no Yes). Além disso, fez filmes de vanguarda, e caiu de cabeça na militância política contra a Guerra do Vietnã, realizando passeatas pela paz mundial, os famosos "bed ins" com Yoko Ono em Amsterdam e Montreal, aonde gravou seu primeiro single solo "Give Peace a Change".
Lutou contra o vício de heroína, optando por parar com a droga por conta própria, para evitar o sensacionalismo da Imprensa caso se internasse numa clínica de tratamento. por causa disso teve terríveis crises de abstinência, que são contadas em detalhes nos versos de "Cold Turkey", seu segundo single solo.
O terceiro foi "Instant Karma!", que está entre as músicas lançadas de forma mais rápida na história da música pop, pois foi gravada no mesmo dia em que foi escrita e sendo lançada apenas dez dias depois, em 6 de fevereiro de 1970. Lennon, certa vez, chegou a dizer que "a escreveu para o café da manhã, a gravou para o almoço e a lançou no jantar". A gravação contou com a guitarra e os backing vocals de George Harrison.
Outro problema da época era a perseguição que o Jonh e Yoko sofriam. O mundo não aceitava que Lennon podendo escolher qualquer mulher no mundo, tivesse se apaixonada por uma japonesa esquisita e que ainda carregava o estigma de ser a responsável pelo fim da Maior Banda de todos os Tempos. A perseguição beirava o racismo, com grande desrespeito a Yoko Ono,uma grande artista plástica, que viveu uma verdadeira "Inquisição" em plena era hippie de "paz e amor livre".
Com tudo isso acontecendo ao mesmo tempo, Lennon mesmo vivendo plenamente seu amor com Yoko e de ser idolatrado por milhões de fãs, estava passando por enorme sofrimento, numa angústia existencial, associada a muita raiva e revolta. Nessa fase conheceu o Dr.Arthur Janov e sua "Terapia do Grito Primal" que prometiam a cura das neuroses, baseado no tratamento dos traumas de infância que influenciavam na vida adulta. O casal participava da terapia com Janov que consistia em fazer o paciente berrar as dores durante toda a vida desde o parto. Dessa forma John tentou lidar com seus traumas da infância, como o fato de ser abandonado pela mãe, Julia, que o entregou com cinco anos para a irmã Mimi, morrendo atropelada quando Lennon tinha 18 anos, e acabara de retomar contato (história mostrada no filme "O Garoto de Liverpool" "O GAROTO DE LIVERPOOL" ("NOWHERE BOY") TEM SUA PREMIERE BRSASILEIRA NO "FESTIVAL DO RIO 2010"
Foi em pleno processo de terapia que John Lennon compôs o reprtório todo do excelente LP "John Lennon/Plastic Ono Band". Produzido pelo "mago sonoro" Phil Spector (que já trabalhara com os Beatles em "Let It Be"), o álbum foi gravado em estúdio, mas como se fosse ao vivo, com o mínimo de uso de overdub, sem muita produção, com uma sonoridade simples e crua, com muito pouco uso de efeitos. Os músicos tocando no formato de power-trio, com John fazendo as vozes, guitarra e piano, e contando com a participação do companheiro Ringo Starr na bateria, e do amigo Klauss Voormann no baixo. Fora o trio, Billy Preston tocou piano em "God" e Phil Spector dobrou o piano de Lennon em "Love".
O som fúnebre de sinos abrem o disco em "Mother", como se tocassem no velório de sua mãe, que já havia sido homenageada em "Julia" do Álbum Branco dos Bestles. Na letra Lennon mostra a dor e a mágoa de ter sido abandonado por sua progenitora:"Mãe, você me teve, mas eu nunca tive você – Eu te queria, você não me quis"(“Mother, you had me, but I never had you - I wanted you, you didn't want me”), e também pelo pai: “Pai, você me deixou, mas eu nunca te deixei – Eu precisava de você, mas você não precisava de mim” (Father, you left me, but I never left you - I needed you, you didn't need me”). Uma balada triste e bem lenta, que contrasta com a bateria forte e marcada de Ringo e com os gritos finais de John como se tentasse exorcisar a dor.
"Hold On" é antítese da anterior, uma baladinha gostosa, onde a guitarra com vibrato de John dá o clima, numa letra onde ele pede calma, e mostra otimismo pra que tudo dê certo no final.
"I Found Out" é uma das mais pesadas, John usa um violão de aço num amplificador com a regulagem toda saturada, pra dar uma distorção bem tosca e agressiva. Na letra cantada com raiva, ele diz pra se ter cuidado pra não se ser enganado por drogas ou religiões, e que nenhum guru pode enxergar além de seus olhos.
Gravada só com a voz e o violão, "Working Class Hero" é mais um exemplo da influência de Bob Dylan em sua música, numa verdadeira "música de protesto" sobre as dificuldades do trabalhador atingir seus objetivos com a lei do Capitalismo selvagem e do lucro a qualquer custo, e as opressões que recebemos desde o dia em que nascemos.
Em "Isolation" ele fala de mais um dos seus medos: a solidão e o isolamento, numa balada onde o destaque é seu piano.
Em "Remember" tem a levada constante marcada pelo piano, até mudar um pouco o andamento no refrão. A letra faz as perguntas: "Lembra quando você era jovem e os heróis nunca eram enforcados, sempre se safavam? Lembra quando você era pequeno e todos pareciam tão altos e tudo tinha que ser do jeito deles? Lembra de seu pai e sua mãe que pareciam querer ser astros do cinema, sempre representando seus papéis?" ("Remember when you were young? - How the hero was never hung... Just remember when you were small - How people seemed so tall - Always had their way - Do you remember your Ma and Pa - Just wishing for movie stardom - Always, always playing a part").A minha preferida do disco é a belíssima "Love". De forma bem simples faz uma declaração de amor, aonde talvez a beleza esteja justamente na singeleza da letra. A canção começa em fade in, aumentando de volume, com bonita introdução de piano.
"Well Well Well" é um verdadeiro Rock pauleira, com Riff de guitarra maneríssimo, e a banda tocando como um verdadeiro power-trio. Já "Look At Me" é uma balada com uma doce melodia, com letra que mostra uma certa crise existencial, aonde John pede atenção.
"God" é a música mais polêmica da carreira solo de Lennon. Foi escrita depois de uma conversa com Janov, que o explicou que as pessoas buscam na religião consolo para o sofrimento; daí John criou o verso inicial "Deus é um conceito pelo qual medimos nossa dor". Na canção ele nega acreditar em mitos ou símbolos, sejam eles religiosos (Jesus, Buda, Krishna), políticos (Kennedy, Hitler), ou musicais (Elvis, Bob Dylan, e até Beatles); dessa forma ele afirma acreditar somente nele mesmo, em Yoko, e no amor que os une.
Paradoxalmente, Billy Preston, evangélico praticante, foi convidado propositalmente a tocar na faixa, talvez pra mostrar que Lennon nunca foi contra a fé das pessoas, e sim queria mostrar qual era a sua forma de encarar o assunto, sem querer ofender ninguém.
No fim da música, ainda decreta: “o sonho acabou”, numa forma de tentar acordar as pessoas a encarar a realidade. Muitos entenderam que ele estivesse se referindo a uma nova reunião dos ex-beatles, que seria um sonho impossível.
O álbum é finalizado com "My Mummy’s Dead", retornando ao assunto da faixa inicial: a morte da mãe, mas dessa vez num ar de lamentação e tristeza, gravado apenas com guitarra e voz, com som abafado, como se quisesse esconder sua dor.
Pra muitos "John Lennon / Plastic Ono Band" é o melhor trabalho de sua curta carreira solo. Particularmente prefiro "Imagine", lançado logo em seguida. Mas não tem como negar que é um discaço, cheio de energia, simplicidade e crueza. As letras extremamente diretas, sobre assuntos cruciais e ao mesmo tempo fundamentais, tocaram profundamente e influenciaram muita gente boa na forma de pensar, viver e de fazer arte.
Famoso trabalho de Andy Warhol numa imagem de Lennon
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Mais uma vez, um post incrível que faz refletir. Conforme você ia comentando as músicas, eu ia buscando em meu computador as que eu havia baixado... Em "Mother" eu tive que parar para chorar, por me identificar com a música. Minha mãe não me abandonou mas, meu pai é vivo e está conosco mas, é como se não estivesse... Não entrarei em detalhes... Mas também senti vontade de gritar para exorcizar meus demônios, como na "Terapia do Grito Primal"... Já escutei a música mais de 15 vezes, ainda choro e tenho vontade de gritar... Vou tirar... e partir para "Hold On", verei se fico melhor.
ResponderExcluirTomei a liberdade de compartilhar em meu Facebook, este Post, com alguns de meus amigos. Já baixei "John Lennon / Plastic Ono Band" e "Imagine", estou ouvindo o segundo no momento. Antes eu havia baixado "Shaved Fish" de 1975, porque tenho o LP que, era do meu pai, mas não posso ouvi-lo e, também "Lennon Legend, The Very Best Of" de 1997. Obrigada!!!
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